Personalidade Civil
Aduz o Código Civil:
"Art. 1º Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil."
Esse dispositivo trata da personalidade civil. O legislador como bem se pode perceber optou por utilizar a palavra "pessoa" no lugar de "homem" atendendo à isonomia da Constituição Federal de 1988. Percebe-se então que o requisito necessário a ensejar que algo se torne capaz de ser sujeito de direitos e de suportar deveres é ser pessoa.
Mas o que vem a ser pessoa exatamente?
Personalidade e capacidade são conceitos diferentes. Personalidade é, de modo geral, a aptidão genérica de ser titular de direitos e de contrair obrigações. Capacidade é a medida da personalidade que será vista logo a frente.
A personalidade civil tem início com o nascimento com vida, conforme diz o art. 2º. Nesse sentido, o Código Civil adotou a Teoria Natalista, segundo a qual o nascimento (com vida) é o marco inicial da personalidade civil. Nesse sentido, temos duas observações a serem feitas. Uma é a de que é necessário saber o que significa o "nascer com vida". O entendimento é o de que o início da vida se dá com a expulsão natural ou mecânica do conteúdo uterino e que este tenha nem que por um instante o funcionamento do aparelho cardiorrespiratório. Outra é a de que o direito não exige a forma humana para se conhecer do nascimento com vida; tal critério humanista comporta as pessoas que nascerem com qualquer tipo de deformidade ou deficiência que as distanciem do conceito comum de forma humana.
Perceba entretanto que muito embora apenas quem nasce com vida é que se torna sujeito de direitos e titular de obrigações, a lei reservou aos nascituros, desde a concepção, na parte final do art. 2º a resguarda de seus direitos. Dois conceitos tomam extrema relevância, o de nascituro e o de concepção. Nascituro é o que está por nascer, mas distingue-se do concepturo que é o que está para ser concebido. No desenvolvimento da embriologia humana, existe uma cadeia de atos cuja compreensão é inafastável.
Fecundação é o ato de entrada do espermatozóide no óvulo, ao passo que fecundação é o ato de migração do óvulo fecundado para o útero. Desse modo, se a lei põe a salvo os direitos do nascituro desde a concepção, deve-se ter em mente, desde a migração do óvulo fecundado para o útero. Esse é o marco inicial para a proteção dos direitos do nascituro. Mas o nascituro tem a guarda de todos os direitos comuns e inerentes à figura de pessoa? Claro que não posto que se trata de uma exceção ao preceito de que o início da titularidade de direitos se dá com o nascimento com vida. Dessa forma, são apenas alguns os direitos assegurados ao nascituro, exatamente o mínimo existencial para que ele se desenvolva. Podemos citar que o nascituro tem os seguintes direitos: vida, proteção, doação, legado, herança, investigação de paternidade por meio de exame de DNA, ...
É exatamente a concepção o marco temporal a partir do qual a destruição da vida uterina implica no crime de aborto, e antes do qual permitida a ingestão da pílula do dia seguinte.
Passemos agora a ver o que significa capacidade civil. Capacidade como já dito é a medida da personalidade, mas o que de maneira específica isso vem a significar? Capacidade é a aptidão de exercer pessoalmente os atos da vida civil e esse conceito se depreende do art. 3º do Código Civil. Temos então a regra de que todos que nascem com vida têm personalidade civil, entretanto, a lei obsta casos nos quais mesmo com personalidade não se tem capacidade plena. A incapacidade é medida em duas graduações, uma que é absoluta e é a completa incapacidade do exercício pessoal dos atos da vida civil ao passo que a outra é relativa na qual a pessoa não tem a capacidade plena ou não tem a concernente a certos atos da vida civil.
Assim é que os artigos 3º e 4º do diploma civilista conceituam as incapacidades absolutas e relativas:
"Art. 3o São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil:
I - os menores de dezesseis anos;
II - os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos;
III - os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade.
I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;
II - os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido;
III - os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo;
IV - os pródigos."
Vamos tratar primeiro do art. 3º, ou seja, dos casos de incapacidade absoluta. O inciso I aduz a um critério etário que o legislador achou por bem fixar como corolário de uma maturidade padrão. Leva em consideração o estudo da psique humana no bom desenvolvimento de cada um. É portanto um critério de natureza objetiva, cuja comprovação se dá com a simples apresentação de documento de identificação. O inciso II trata da falta de discernimento para a prática dos atos da vida civil. Enquadram-se nesse inciso as pessoas com problema neurológico ou de deficiência mental, sendo pois critério subjetivo e necessária a apresentação de boletim de médico que ateste a deficiência ou enfermidade. O inciso III, clássico na doutrina, traz o exemplo das pessoas que se encontram em situação de coma entre outras, ou seja, aquelas que mesmo transitoriamente não puderem exprimir vontade. Nesse ponto há um avanço do legislador, que em 1916 incluía nesse rol os surdo-mudos que não conseguirem exprimir a vontade.
O art. 4º traz os casos de incapacidade relativa. O critério do inciso I é semelhante ao mesmo inciso do artigo anterior, a fixação etária. O inciso II trata do discernimento reduzido. Nesse sentido, mister se faz uma diferença. É imprescindível que se veja no caso concreto se o discernimento é reduzido ou se inexiste, sendo no primeiro, caso de incompetência relativa, e no segundo, absoluta. O inciso III engloba com maestria casos como o da Síndrome de Down, na qual o desenvolvimento mental é incompleto, mas veja que por incompleto se entende que há algum discernimento. O inciso IV que merece análise mais detalhada trata dos pródigos e por pródigo se entende a pessoa que dilapida seu patrimônio, é uma questão de desvio comportamental que leva a pessoa a gastar todo seu patrimônio indiscriminadamente.
Mais importante que entender os casos de incapacidade é saber a consequência da determinação da incapacidade em cada caso. Neste momento do estudo, o importante é saber que os atos praticados por um absolutamente incapaz estão eivados de nulidade ao passo que os do relativamente incapaz precisam de confirmação. Para isso é que o absolutamente incapaz precisa de representação e o relativamente incapaz de assistência.
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